Prefácio

Você está com uma compilação de dois anos de postagens diárias de um blog em suas mãos. Olhando para trás, percebo que cometi muitos erros, mas isso não me incomoda. Se não conseguisse identificar as coisas que fiz de errado, significaria que não havia melhorado minha escrita e compreensão desde 2009. Quando dizemos “opa”, significa que evoluímos em nossas crenças e estratégias. Portanto, se eu olhar para trás e não ver nenhuma falha, isso significaria que eu não aprendi nem mudei minha opinião sobre nada desde então.

Cometi um erro ao não escrever minhas postagens dos últimos dois anos visando auxiliar as pessoas a terem uma vida cotidiana melhor. Em vez disso, eu me propus a ajudar a solucionar problemas importantes, difíceis e de grande porte, selecionando exemplos abstratos que soavam impressionantes.

Ao olhar para trás, percebo que esse foi o segundo maior erro na minha abordagem. Ele está relacionado ao meu maior erro na escrita, que foi não entender que o grande desafio em aprender essa valiosa forma de pensamento era descobrir como colocá-la em prática, em vez de apenas conhecer a teoria. Não me dei conta de que essa parte era a prioridade e, sobre isso, apenas posso dizer “Opa” e “Duh”.

Sim, em certas ocasiões as grandes questões são realmente importantes e significativas, mas isso não muda o simples fato de que para dominar habilidades, é necessário praticá-las, e isso é mais difícil praticar utilizando coisas que estão mais distantes (atualmente, o Centro para Racionalidade Aplicada — Center for Applied Rationality — está trabalhando para corrigir este enorme erro que cometi de uma forma mais sistemática).

Cometi um terceiro grande erro ao me concentrar demais na crença racional e muito pouco na ação racional.

O quarto maior erro que cometi foi que eu deveria ter organizado melhor o conteúdo que eu estava apresentando nas sequências. Mais especificamente, eu deveria ter criado uma wiki muito antes, e facilitado ler as postagens em sequência. Pelo menos esse erro é corrigível. Neste trabalho, Rob Bensinger reorganizou as postagens da melhor forma possível, sem tentar reescrever o material, apesar de ter reescrito um pouco dele.

Meu quinto grande erro foi tentar, do meu ponto de vista, falar abertamente sobre o que pareciam ideias estúpidas. Eu tentei evitar o “Bulverismo”, uma falácia em que se começa a discussão apontando o quão estúpidas são as pessoas por acreditarem em algo. Sempre discuti o assunto em primeiro lugar e, somente depois, dizia: “E, portanto, isso é estúpido”. Contudo, em 2009, eu ainda estava incerto se seria importante atrair pessoas que expressavam desprezo pela homeopatia. Eu acreditava — e ainda acredito  que existe um lamentável problema em tratar ideias com cortesia, fazendo muitas pessoas acreditarem, em algum nível, que “nada de ruim vai acontecer comigo se eu disser que acredito nisso; eu não perderei status se eu disser que acredito em homeopatia”. Nesse sentido, o riso de escárnio dos comediantes pode ajudar as pessoas a despertarem do sonho.

Atualmente, eu escreveria de maneira mais cortês, acredito eu. Embora a falta de cortesia tenha desempenhado um papel útil e ajudado algumas pessoas, agora entendo melhor o risco de criar comunidades nas quais a reação normal e esperada às opiniões de baixo status é o desprezo e a zombaria. Apesar do meu erro, fico feliz em dizer que meus leitores têm sido surpreendentemente bons em não usar minha retórica como uma desculpa para intimidar ou menosprezar os outros (gostaria de destacar Scott Alexander aqui em particular, uma pessoa mais gentil do que eu e um escritor cada vez mais excepcional sobre esses temas, e talvez mereça parte do crédito por manter a cultura saudável do Less Wrong).

Poder olhar para trás e dizer que você “fracassou” implica que você tinha objetivos. Então, o que eu estava tentando realizar?

Existe uma maneira valiosa de pensar que ainda não é ensinada nas escolas atualmente. Essa maneira de pensar não é ensinada de forma sistemática, absorvida apenas por pessoas que cresceram lendo livros como Surely You’re Joking, Mr. Feynman (Com certeza, você está brincando, Sr. Feynman!) ou que tiveram um professor especialmente bom na escola.

Mais famosamente, essa determinada maneira de pensar tem a ver com a ciência e com o método experimental. A parte da ciência em que se sai e se observa o universo, em vez de simplesmente inventar coisas. A parte em que se diz “Opa!” e se desiste de uma teoria ruim quando os experimentos não a apoiam.

Mas essa maneira específica de pensar vai além disso. É mais profunda e mais universal do que um par de óculos que você usa quando entra em um laboratório e tira quando sai. Aplica-se à vida cotidiana, embora essa parte seja mais sutil e mais difícil. Mas se você não consegue dizer “Opa!” e desistir quando algo não está funcionando, você não terá escolha senão continuar a atirar no próprio pé. Você terá que continuar recarregando a arma e puxando o gatilho. Você conhece pessoas assim. E em algum lugar, em algum ponto da sua vida em que você prefere não pensar, você é uma pessoa assim. Seria bom se houvesse uma maneira específica de pensar que nos ajudasse a parar de fazer isso.

Mesmo com a grandeza dos meus erros, os dois anos de postagens parecem ter ajudado um número surpreendente de pessoas em um grau surpreendente. Não funcionou consistentemente, mas em alguns momentos funcionou.

Na sociedade moderna, são ensinadas tão poucas habilidades de crença racional e tomada de decisão, bem como a matemática e as ciências subjacentes a elas, que ocorre que a simples leitura de um enorme brain-dump (despejo mental) repleto de problemas de filosofia e ciência pode ser surpreendentemente benéfica. Analisar tudo isso a partir de uma dúzia de perspectivas diferentes pode transmitir, por vezes, uma ideia do núcleo central dessas habilidades.

Pois, no fim das contas, tudo é uma coisa só. Eu discuti grandes e importantes questões distantes e negligenciei a vida cotidiana, mas as leis que as governam não são realmente diferentes. As grandes lacunas que foquei e os exemplos escolhidos estavam errados, mas no final das contas, tudo é uma coisa só. Fico orgulhoso de olhar para trás e afirmar isso, mesmo após todos os erros que cometi e as outras vezes em que precisei dizer “Opa”…

Ainda hoje, após cinco anos, isso me parece melhor do que nada.

 Eliezer Yudkowsky, fevereiro de 2015.