Minha juventude selvagem e imprudente

Dizem que os pais fazem tudo o que dizem aos filhos para não fazer, e é dessa forma que eles aprendem o que não devem fazer.

Há muito tempo, em um passado distante, eu era um racionalista tradicional dedicado e me considerava habilidoso nesse campo, mas ainda não conhecia o Caminho de Bayes. Quando jovem, Eliezer se deparou com uma questão aparentemente misteriosa e, apesar de seguir os preceitos da Racionalidade Tradicional, não conseguiu evitar inventar uma Resposta Misteriosa. Até hoje, esse é o erro mais embaraçoso que cometi em minha vida e ainda sinto arrepios ao pensar nele.

Qual foi a minha resposta misteriosa para uma pergunta misteriosa? Eu não vou descrevê-la, pois seria uma história longa e complicada. Eu era jovem e apenas um racionalista tradicional que não conhecia os ensinamentos de Tversky e Kahneman. Eu sabia sobre a Navalha de Ocam, mas não sobre a falácia da conjunção. Pensei que poderia me safar pensando coisas complicadas , no estilo literário dos pensamentos complicados que leio nos livros de ciências, sem perceber que a complexidade correta só é possível quando cada etapa é definida de forma clara e precisa. Hoje, um dos principais conselhos que dou aos jovens aspirantes a racionalistas é: “Não tente longas cadeias de raciocínio ou planos complicados”.

Nada mais precisa ser dito: mesmo após inventar minha “resposta”, o fenômeno ainda era um mistério para mim e possuía a mesma qualidade assombrosa de impenetrabilidade que tinha no início.

Não se engane, o jovem Eliezer não era estúpido. Todos os erros que ele cometeu ainda são cometidos hoje por cientistas respeitados em revistas de renome. Seria necessário um discernimento mais refinado para protegê-lo do que o que foi ensinado como racionalista tradicional.

De fato, o jovem Eliezer seguiu diligente e meticulosamente as injunções da Racionalidade Tradicional ao se desviar do caminho.

Como um racionalista tradicional, o jovem Eliezer teve o cuidado de garantir que sua Resposta Misteriosa fizesse uma previsão ousada da experiência futura. Ele esperava que os futuros neurologistas descobrissem que os neurônios estavam explorando a gravidade quântica, semelhante à ideia de Sir Roger Penrose. Isso exigia que os neurônios mantivessem um certo grau de coerência quântica, algo que poderia ser encontrado ou não.

Mas a minha hipótese não fez previsões retrospectivas. Segundo a Ciência Tradicional, previsões retrospectivas são inválidas, então por que se preocupar em fazê-las? Por outro lado, para um bayesiano, se uma hipótese não tem uma razão de verossimilhança favorável em relação a “não sei”, isso suscita a questão de por que acreditar hoje em algo mais complicado do que “não sei”. No entanto, naquela época, eu não conhecia o Caminho de Bayes, então não estava pensando em razões de verossimilhança ou me concentrando na densidade de probabilidade. Eu havia feito uma previsão refutável; essa não era a lei?

Como um Racionalista Tradicional, o jovem Eliezer teve o cuidado de não acreditar em magia, misticismo, chauvinismo do carbono ou qualquer coisa do tipo. Eu professava com orgulho a minha Resposta Misteriosa: “É apenas física, como o resto da física!” Como se pudesse salvar a magia de ser um isomorfo cognitivo da magia, chamando-a de gravidade quântica. No entanto, naquela época, eu não conhecia o Caminho de Bayes e não via o nível em que minha ideia era isomórfica à magia. Eu havia dado minha lealdade à física, mas isso não me salvou; o que a teoria da probabilidade sabe sobre alianças? Eu evitava tudo o que a Racionalidade Tradicional me dizia para evitar, mas o que sobrava ainda era mágico.

Sem dúvida, a minha lealdade à Racionalidade Tradicional me ajudou a sair do buraco em que me enfiei. Se eu não fosse um Racionalista Tradicional, estaria completamente ferrado. No entanto, a Racionalidade Tradicional não foi suficiente para me corrigir. Isso me levou a erros diferentes daqueles que eu havia explicitamente proibido.

Quando penso em como o meu eu mais jovem seguiu cuidadosamente as regras da Racionalidade Tradicional e, ainda assim, errou, isso explica por que as pessoas que se autodenominam “racionalistas” não governam o mundo. Você precisa de muita racionalidade antes que ela possa fazer qualquer coisa além de levá-lo a novos e interessantes erros.

A Racionalidade Tradicional é ensinada como uma arte, e não como uma ciência; você lê a biografia de físicos famosos, descrevendo as lições que a vida lhes ensinou, e tenta seguir seus conselhos. Mas você não viveu a vida deles, e metade do que eles tentam descrever é um instinto que foi forjado em suas experiências

Do jeito que a Racionalidade Tradicional é concebida, seria aceitável que eu desperdiçasse trinta anos com minha ideia tola, contanto que eu eventualmente conseguisse refutá-la e fosse honesto comigo mesmo sobre o que minha teoria previa, aceitando a refutação quando chegasse, e assim por diante. Isso é suficiente para fazer a Roda da Ciência girar, mas é um pouco difícil para aqueles que perdem trinta anos de suas vidas. A Racionalidade Tradicional é uma jornada, não uma dança. Ela foi projetada para te levar eventualmente à verdade, oferecendo a você muito tempo para apreciar o caminho.

Os racionalistas tradicionais podem concordar em discordar. A Racionalidade Tradicional não considera o pensamento como uma arte exata, na qual existe apenas uma estimativa de probabilidade correta, dada a evidência. Na Racionalidade Tradicional, você formular hipóteses e testá-las. Mas a experiência me ensinou que, se você não sabe e adivinha, acabará se enganando. 

O Caminho de Bayes também é uma arte imprecisa, pelo menos do jeito que estou falando sobre ele. Esses ensaios ainda são tentativas desajeitadas de traduzir em palavras as lições que seriam mais bem-ensinadas pela experiência. Mas pelo menos há matemática subjacente, além de evidências experimentais da psicologia cognitiva sobre como os humanos realmente pensam. Talvez isso seja o suficiente para cruzar o limiar estratosférico necessário para uma disciplina que te permite realmente acertar, em vez de apenas te levar a cometer novos erros interessantes.