O experimento da caverna dos ladrões

Alguma vez, quando criança, você se perguntou se seu acampamento de verão tinha um propósito secreto, como um experimento científico com os monitores observando seu comportamento?

Eu também não.

Mas se tivéssemos lido o estudo Intergroup Conflict and Cooperation: The Robbers Cave Experiment (Conflito e Cooperação Intergrupal: O Experimento da Caverna dos Ladrões) de Sherif, Harvey, White, Hood e Sherif [1], talvez fôssemos mais paranoicos. Esse estudo investigou as causas e soluções para o conflito entre grupos. Os participantes, ou “campistas”, eram 22 meninos de 11 e 12 anos, de 22 escolas diferentes em Oklahoma City, de famílias protestantes estáveis de classe média, com bom desempenho escolar e QI médio de 112. Os pesquisadores buscaram grupos de meninos o mais semelhantes e adaptados possível.

O experimento, após a Segunda Guerra Mundial, visava investigar as causas — e possíveis soluções — do conflito intergrupal. Como eles iniciariam um conflito? Bem, dividiram os 22 meninos em dois grupos de 11, e isso foi o suficiente.

O plano original tinha três etapas. Na Etapa 1, cada grupo se instalaria sem saber da existência do outro. No final da Etapa 1, seriam gradualmente informados sobre o outro grupo. Na Etapa 2, competições com prêmios colocariam os grupos em conflito.

Mas a Etapa 2 foi desnecessária. A hostilidade surgiu assim que cada grupo soube do outro: eles estavam usando nosso acampamento, nosso campo de beisebol. No primeiro encontro, já trocaram insultos. Se autodenominaram Rattlers e Eagles (nomes desnecessários quando eram o único grupo).

Quando os concursos foram anunciados, a rivalidade se intensificou. O espírito esportivo durou dois dias, mas logo se deteriorou.

Os Eagles roubaram e queimaram a bandeira dos Rattlers. Os Rattlers invadiram a cabana dos Eagles e roubaram a calça jeans do líder, que pintaram de laranja e usaram como bandeira, com a frase “O último dos Eagles“. Os Eagles revidaram, invadindo a cabana dos Rattlers, virando camas e espalhando terra. Voltaram para sua cabana, se fortificaram e prepararam armas (meias com pedras). Após os Eagles vencerem a última competição da Etapa 2, os Rattlers invadiram sua cabana e roubaram os prêmios. Isso virou uma briga que os pesquisadores tiveram que interromper. Os Eagles contaram a história como uma grande vitória —  eles perseguiram os Rattlers “até a metade do caminho de volta” (o que não aconteceu).

Cada grupo desenvolveu um estereótipo negativo do outro e um positivo de si mesmo. Os Rattlers xingavam muito. Os Eagles, após uma vitória, concluíram que venceram por suas orações e que os Rattlers perderam pelos palavrões. Decidiram parar de xingar e evitar os Rattlers. Os Eagles se viam como corretos e morais, enquanto os Rattlers se viam como durões.

Os membros de um grupo tapavam o nariz quando o outro grupo passava. 

Na Etapa 3, os pesquisadores tentaram reduzir o atrito. O mero contato não funcionou. Assistir a eventos juntos, como fogos de artifício no 4 de julho, resultou em guerra de comida.

Quer adivinhar o que funcionou?

(Alerta de spoiler…)

Disseram aos meninos que poderia haver falta de água no acampamento devido a um problema no sistema — talvez causado por vândalos. (O Inimigo Externo, um truque clássico.)

Organizaram uma busca entre o acampamento e o reservatório, com quatro equipes (inicialmente, com membros de ambos os grupos). Se nada fosse encontrado, todos se encontrariam na caixa d’água. Nada foi encontrado, e os grupos viram que não havia água nas torneiras. Discutiram o problema, bateram na caixa d’água, encontraram uma escada, verificaram se estava cheia e acharam um saco obstruindo a torneira. Todos a limparam. Sugestões de ambos os grupos foram dadas e implementadas.

Quando a torneira foi limpa, os Rattlers, que tinham cantis, deixaram os Eagles beberem primeiro (eles não tinham cantis). Sem insultos, nem mesmo o típico “damas primeiro”.

A rivalidade não acabou. Houve outra guerra de comida na manhã seguinte. Mas algumas tarefas que exigiam cooperação entre os dois grupos — como, por exemplo, ligar um caminhão enguiçado — foram eficazes.  No final, os Rattlers usaram US$5 ganhos em um concurso para comprar malte para todos.

O experimento da Caverna dos Ladrões ilustra a psicologia dos bandos de caçadores-coletores, ecoando ao longo do tempo, tão perfeitamente quanto qualquer experimento já concebido pela ciência social.

Qualquer semelhança com a política moderna é pura imaginação. (Às vezes, eu penso que a segunda maior necessidade da humanidade é um supervilão.

Referências

[1] Muzafer Sherif et al., “Study of Positive and Negative Intergroup Attitudes Between Experimentally Produced Groups: Robbers Cave Study,” Unpublished manuscript (1954).